quarta-feira, março 31, 2004

Me senti nua

Texto que escrevi no avião, regressando de Nova York

Nua sem meu bloco laranja

Chuva. Muita chuva caindo em Nova York nesta tarde de terça feira. Atrasada pego o meu onibus rumo ao aeroporto JFK na Times Square e assim, olhando a chuva pela janela, digo adeus a Mannhattan.
Chego em cima da hora, faço o check in e ninguém me pergunta nada, ninguém revista nada e eu entro correndo pelos corredores do aeroporto para chegar o meu portão de embarque. Meu destino é o Rio de Janeiro com escala em Atlanta onde tenho que trocar de avião. Já embarcando o oficial do departamento de imigração do governo dos Estados Unidos pede meu passaporte e desconfiado de não sei o que, pede que eu aguarde ao lado. Enquanto esperava reparei que os passageiros eram abordados de forma aleatória, mas somente não americanos eram abordados. Concentrei minha atenção `as perguntas que o oficial fazia ao mineiro também “pescado” entre os passageiros na fila de embarque. O oficial parecia querer encontrar alguma coisa. Perguntou o porque da viagem, se o brasileiro havia trabalhado nos EUA…em um determinado momento ele chegou a dizer:: “onde esta o green card falsol?” O mineiro soltou uma gargalhada brasileira, daquelas bem gostosas e disse: “isso você ano vai encontrar de maneira nenhuma companheiro.”
Chegou a minha vez. Um dois oficiais já havia começado a fazer as perguntas de praxe e eu repetia: “sou mochileira, estava viajando pelos Estados Unidos” quando o outro oficial, aquele preocupado em mostrar serviço para as autoridades, começou a revistar a minha bolsa de mão. Ele perguntava o que eu vim fazer no país e eu repetia: “sou mochileira” . Ele dizia que algo estava errado no meu visto porque nele estava escrito “possibility of studying english” e eu havia dito que tinha decido não estudar. “ vc mentiu as autoridades” ele dizia. Com arrogância ele continuava: “Quantas vezes vc veio aos Estados Unidos? Duas? Você pode ter certeza que eu vou assegurar que está seja a última vez e que você não possa mais voltar a este país…como vc consegue dinheiro para viajar?” Eu expliquei que havia juntado um boa quantia de dinheiro e que, sendo jornalista independente, eu escrevia matérias e tentava vendê-las a veículos de mídia independente no Brasil, assim eu fazia dinheiro enquanto viajava.
Então ele encontrou meu bloco laranja. Este bloco é como um diário para mim, onde eu anoto meus contatos, minhas fontes, informações sobre tudo que acho interessante, meus pensamentos mais absurdos. Ele se achou no direito de ler meu bloco laranja. Com meia dúzia de palavras que sabia em português começou a especular sobre minhas anotações. Endereços, telefones, ele perguntava: “aonde vc trabalhou?” e eu não trabalhei em lugar nenhum! Sou jornalista, viajo em busca de histórias e este bloco é meu instrumento de trabalho! Uma das anotações correspondia a palestra de Ellen Scherder que, na conferência “reframing 9/11” comparou a política de segurança interna adotada pela administração Bush `a era Mcartney quando comunistas eram perseguidos pelo governo americano. O oficial começou a rir com o que tinha lido e em voz alta lia ao colega: “ela compara Mcartney a Bush”. Ai eu me irritei mesmo. Primeiro, não fui eu quem comparou, foi Ellen Scherecker…..segundo que, mesmo que eu achasse isso, é a minha opinião, escrita no meu bloco laranja! “Quem disse que vc pode invadir meu espaço desta maneira? Vc esta lendo o meu diário! Quem lhe deu este poder? Ele respondeu “O departamento de imigração do governo dos Estados Unidos que é responsável pelo controle de entrada e sadia de pessoas como vc para assim assegurar proteção ao nosso povo”. Certo. Enato o governo americano cria uma lei que permite a invasão da minha privacidade, cidadã brasileira?

Ellen Schereder na mesma palestra disse: “O Patriot atc é uma invasão em nossas casas justificada pela proteção do nosso povo”.